Após pouco mais de 70 (setenta) dias do novo governo eleito, o INSS mantém e amplia o caos institucional na autarquia, tanto com relação às barreiras de acesso da população ao atendimento no INSS, quanto à intensificação e precarização do trabalho dos(as) servidores(as) e, principalmente, as propostas equivocadas para resolver as filas de análise de processo de benefícios.

Sem cumprir o Acordo de Greve de 2022 em pontos cruciais para a categoria, como a integralização do VB ao salário-base, carreira e sem acatar as propostas dos representantes dos trabalhadores nos Comitês, conforme o acordo, o Governo acena com mais um projeto sem sentido para resolver o problema estrutural das filas no INSS.

Novamente, e sem nenhum diálogo, a Diretoria do INSS fala em aprofundar ainda mais as políticas produtivistas que acarretaram arrocho salarial, pioras das condições de trabalho e adoecimento da categoria.

Como já alertado por esta Federação, o programa de Bônus de Produtividade não reduziu o problema das filas no INSS, gerou um aprofundamento da política de arrocho salarial e rendimentos salariais variáveis além de aumentar o adoecimento da categoria.

Tanto que os programas de gestão estão sendo objeto de auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) no que tange à sua eficiência e prevalência do interesse público. A Federação destaca que a eficiência do órgão está diretamente vinculada à uma política real de valorização dos seus servidores, com valorização salarial – hoje o salário base da carreira do seguro social é em média 20% inferior ao salário mínimo -, Plano de Carreira, concurso público e condições de trabalho.

Tais pautas foram fruto do Acordo da Greve de 2022, considerando as diversas inconsistências dos Programas de Gestão bem como as questões relativas ao trabalho presencial, seja nas Agências da Previdência Social (APS’s) ou nas Centrais de Análise.

Sem presidente definitivo, o presidente interino que assumiu o cargo em 02/02/2023, Glauco André Fonseca Wamburg, parece estar confortável em permanecer no mesmo projeto do governo anterior, sem alteração das equipes de gestão, e sem apresentar quaisquer propostas de mudanças significativas para atendimento da missão precípua da autarquia, “garantir proteção aos cidadãos por meio do reconhecimento de direitos e execução de políticas sociais”. Na realidade está propondo ações que aprofundam a lógica do governo que estabeleceu um caos institucional no INSS. Ou seja, o projeto de destruição do INSS permanece em curso.

No recente documento apresentado ao Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS, o “Programa de Aceleração da Produtividade e Análise no INSS” de 13/03/2023 (veja aqui), apresenta mais uma proposta de continuidade do governo Bolsonaro, sem diálogo com as entidades representativas dos(as) servidores(as) – inclusive há várias ações de descumprimento de acordo de greve – e um projeto certamente fadado ao fracasso em relação aos reconhecimento dos direitos da população, bem como aprofunda a perspectiva produtivista implementada aos servidores(as) que só gerou um alto índice de adoecimento nos poucos servidores(as) que restou restaram no INSS.

Porém, é importante enfatizar que finalmente abriram “a caixa de pandora” do INSS, demonstrando os dados reais do instituto. Vamos a eles:

  • Sobre os atendimentos presenciais e virtuais: no mês de fevereiro ocorreram 55,1 milhões de acessos nos canais de atendimentos remotos e apenas 1,8 milhões de atendimentos presenciais, ou seja, apenas 3,3% da população atendida no INSS tiveram obteve acesso ao atendimento presencial. Isso não representa que a população está acessando com facilidade os canais remotos, mas sim que está em muitas vezes pagando por um serviço que o Estado deveria oferecer ou que o INSS terceirizou. Uma uma atividade que deveria ser oferecida pela autarquia, considerando que na sequência foi exposto no documento que há, 3.990 entidades conveniadas e mais de 146 mil advogados atuando nos convênios por meio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

REAL “FILA”

Sobre a REAL “fila” de análise de benefícios apresentadas no documento, foi apresentada a Tabela 01:

Tabela 01: Demandas e quantidade de represamento das “filas” no INSS

Demandas da Fila Represamento em 02/2023
Reconhecimento Inicial de Direitos 1,8 milhões
Recursos 2,4 milhões
Demandas Judiciais 294 mil
Revisão 418 mil
Seguro Defeso 793 mil
Apuração de Irregularidades 640 mil
Manutenção de Benefícios 725 mil
Atualização de Cadastros 58 mil
Total 7,1 milhões

Disponível aqui, na página 5. Acesso em 15/03/2023


As informações sobre as “filas” do INSS merecem uma análise detalhada. Primeiro há mais recursos represados do que reconhecimento inicial de direitos, sendo: 1,8 milhões de benefícios reconhecimento inicial e 2,4 milhões de recursos. O recurso objetivamente configura-se como o retrabalho. É o requerimento em que o cidadão discorda da análise do INSS.

Existem hoje no INSS 33% mais recursos do que reconhecimento inicial. Mas podemos ir além, e deixar perfeitamente demonstrado o fracasso do atual modelo de atendimento do INSS, para além de sua face perversa, tão conhecida pela população, se verificarmos que em relação ao reconhecimento inicial. Também as demandas judiciais possuem 16% mais requerimentos, bem como as revisões, com percentual de 23%.

As informações quantitativas são evidentes: há um relevante problema na gestão do INSS, recursos, demandas judiciais e revisões que representam 38% das demandas de represamento, são problemas que envolvem a forma de acesso, o assédio por metas abusivas de produtividade, falta de capacitação, adoecimento da categoria e tantos outros problemas criados pelo último governo que têm afetado a qualidade do atendimento prestado à população.

No entanto, o motivo central de finalmente abrirem a “caixa pandora” com os dados reais do caos institucional da autarquia foi propor uma Medida Provisória para que estabeleça o “Programa de Aceleração da Produtividade e Análise”, que denominam de forma esdrúxula de “PAPA-Fila”.

A proposta está centrada em aumentar a linha produtivista aos moldes da contrarreforma administrativa (PEC nº 32/2020) que já vem sendo implementada no INSS nos últimos anos, com metas abusivas de produtividade que substituem a jornada de trabalho e programas de gestão construídos sem nenhuma base científica, ideias mirabolantes de gestores do governo Bolsonaro que permanecem na gestão no atual governo.

SUPEREXPLORAÇÃO

O chamado “Papa-Fila” aprofunda a lógica produtivista da superexploração, trazendo novos critérios para pagamento de Bônus de produtividade, sendo eles:

  1. Pagar o bônus para quem: aderir ao Programa de Gestão de Desempenho – PGD (ou mesmo para quem não aderiu, mas esteja designado para quaisquer das Centrais de Análise) e alcançar pontuação com um adicional de 30% da meta de produtividade; e,
  2. Cumprir a jornada de trabalho (observada a regra anterior) e concluir mais de dois processos diariamente nas filas ordinárias de reconhecimento inicial de direitos.

Essas regras estabelecidas são inconstitucionais! O servidor tem que cumprir a meta com majoração de 30% ou jornada de 40 horas semanais + análise de dois processos além da jornada, podendo trabalhar 10, 12, 14 horas para ter acesso posterior, há um bônus de R$ 57,50 reais por processo analisado.

A lógica é que os servidores(as) trabalhem 20 horas por dia? Regras arcaicas para as condições de trabalho, em uma “suposta” modernização divulgada pelo INSS.

Ou seja, aplicam a mesma perspectiva de linha de produção, desconsiderando que os(a) trabalhadores(as) que buscam o INSS não são mercadoria, nem o(a) servidor(a) uma máquina de produção dos tempos fordistas. O objetivo é aprofundar o assédio institucional e o adoecimento da categoria e depois descartá-los, com já tem ocorrido com diversas aposentadorias por invalidez de servidores(as) em várias regiões do país.

Será que desconsideram as mais recentes publicações acerca do trabalho na era digital e empurram o trabalhador a um limite extremamente perigoso não só para a entrega eficiente do produto de seu trabalho, mas também de sua saúde?

Vários artigos (confira aqui) já demonstram que a alteração do ciclo circadiano nos atuais parâmetros que envolvem o trabalhador remoto e sem jornada tem levado ao aumento de doenças metabólicas graves, como diabetes e obesidade, além de alterar por completo o ciclo hormonal que incluem os processos metabólicos do cortisol e melatonina.

Como “pintos” chocados e desenvolvidos para a engorda, que ficam longos períodos em iluminação permanente para o rápido crescimento e abate, alterando a os ciclos naturais em função da PRODUTIVIDADE e do lucro, os servidores hoje parecem ter o mesmo fim, pois “papar a fila” significará romper ainda mais com períodos naturais de descanso e relaxamento e pressionar cada vez mais o trabalhador para horários e funções adoecedoras.

Os problemas recorrentes nos sistemas e os critérios absurdos de mensuração de abatimentos já tem feito esse trabalho de maneira muito competente, agora tal nova proposta “inovadora” aprofunda ainda mais os rumos já deficientes dados pela Direção Central da autarquia.

Percebe-se que em momento algum o programa cita os problemas estruturais do Instituto, que afetam diretamente o cotidiano de trabalho dos servidores, a qualidade do serviço prestado, bem com a eficiência do órgão.

Durantes os meses de fevereiro e recentemente no mês de março de 2023, as indisponibilidades dos sistemas foram rotina, praticamente impedindo os servidores de trabalho, sem contar o parque tecnológico defasado, internet lenta e instalações precárias nas Agências.

Ou seja, não há plano milagroso ou programa de gestão que resolva a demanda do INSS sem levar em considerações as terríveis condições de infraestrutura pela qual o órgão passa.

Essa é a solução dos(as) gestores(as) indicados pelo governo Bolsonaro que permanecem no INSS para “zerar” a fila? Esses são os caminhos que o atual Governo irá trilhar para alcançar seus objetivos? Acelerar ainda mais o adoecimento e a superexploração de seus servidores? Certamente mais uma proposta que fracassará.

Ainda, a maioria dos(as) servidores(as) que fizeram bônus de produtividade nos dados apresentados pelo documento, conseguiram concluir 8 processos no mês, com o valor de R$ 500,00 reais, cerca de 65% dos(as) servidores(as).

Os(as) gestores(as) parecem se iludir com uma proposta diferente da realidade. É extremamente evidente a lógica de aprofundamento de produtivista, de assédio moral institucional e que desconsidera que o INSS trabalha com pessoas, trabalhadores(as) que buscam o seu direito, e não com uma linha de produção de objetos.

Por fim, o que fica demonstrado na proposta do “Papa-Fila” é seu caráter ultraneoliberal, é o foco na redução de custos com os 640 mil processos que estão em análise de irregularidade, 8,5% do total de represamento de pessoas que aguardam o reconhecimento do seu direito, anunciando a lógica da centralidade da redução de direitos.

Acreditamos que esse não será o direcionamento do governo com viés democrático e que anunciou desde a campanha para as eleições a importância do INSS, a maior autarquia pública da América Latina.

DESCUMPRIMENTO DO ACORDO DE GREVE

No acordo de greve foram previstos dois Comitês Permanentes, sendo um dos processos de trabalho dos(as) servidores(as) e outro em relação aos processos de trabalho dos(as) serviços previdenciários (Serviço Social e Reabilitação Profissional).

A proposta do “papa-Fila” se configura em total descumprimento do Acordo de Greve, além de estabelecer uma jornada sem limites, ferindo outras legislações. Aumenta a produtividade sem a discussão no comitê, em continuidade as metas abusivas estabelecidas no governo anterior.

Além disso, a várias medidas estabelecidas por meio do Coordenador dos Serviços Previdenciários – que está em cargos de gestão desde o governo Temer e todo o governo Bolsonaro – com imposição de “dobrar” os atendimentos da Reabilitação Profissional e ampliar o número de atendimentos do Serviço Social, dentre outras medidas, ferem o código de ética profissional dos(as) Assistentes Sociais e as orientações do Conselho Nacional de Serviço Social (CFESS). Ações realizadas sem qualquer diálogo com o Comitê dos serviços previdenciários, aliás, sem nem mesmo ocorrer nenhuma reunião do Comitê Permanente dos Serviços Previdenciários no ano de 2023.

A FENASPS, desde as reuniões com a Equipe de Transição do Governo, em 2022, e inclusive na posse do atual ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, já neste ano, apresentou documento com diagnóstico e proposta sobre o INSS: “Uma bomba-relógio chamada INSS: A urgente e necessária reestruturação da maior autarquia pública da América Latina”, até o momento desconsiderada pelo ministro da previdência e presidente interino do INSS.

Também foi cobrado reiteradamente o acatamento do Acordo de Greve de 2022, que na realidade vem sendo descumprido pela autarquia.

Assim, orientamos a categoria do INSS a não aceitar as metas abusivas e a adesão ao tal “Papa-Fila”. Necessitamos de condições de trabalho dignas para também atender a população com dignidade!

Nenhum servidor está obrigado a aceitar estas imposições absurdas com projetos elaborados por iluminados que vivem descolados da realidade do país.

A FENASPS orienta, ainda, que os servidores e servidoras denunciem os casos de assédio moral junto aos ministérios Público Federal (MPF) e do Trabalho (MPT) e procurem as assessorias jurídicas dos sindicatos filiados. Os(as) trabalhadores(as) não podem ser responsabilizados pelo caos instalado no INSS, que levou aos 7,1 milhões de requerimentos na fila virtual.

A Federação, juntamente com as outras entidades que compõem o Fonasefe, tem envidado negociações no sentido de garantir o reajuste emergencial para os trabalhadores(as) do Serviço Público Federal, bem como a instalação das mesas setoriais que irão discutir as pautas específicas das diversas categorias.

Porém, apesar da importância destes espaços de negociação, é fundamental que a categoria se mantenha mobilizada e participe das assembleias dos sindicatos estaduais para debater as pautas.

É hora de todos(as) se unirem para enfrentar mais este ataque e exigir do governo melhores condições de trabalho!

Fonte: Fenasps